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quarta-feira, 15 de agosto de 2012

Há sítios onde as almas desesperam, mas a gula é satisfeita


Pela segunda vez tive de, num curto espaço de tempo, ir a um apartamento na Rua Pinheiro Chagas, em Lisboa. Como tenho chegado sempre cedo acabo por tomar um café numa pastelaria que há mesmo em frente a esse prédio. A primeira vez que lá entrei, assim que passei do beiral da porta, arrependi-me. Ao balcão estavam dois seres quase imoveis, um em cada ponto extremo do balcão, e o ambiente pesava. Mas a montra tinha tantos, mas tantos bolos e bolinhos e bolachas e biscoitos, que entrei mesmo assim. Sentei-me numa mesa e o tipo diz, numa voz quase sumida e sem o mínimo de simpatia: O que deseja? Pergunta do balcão para a minha mesa que estava no canto oposto. Fiz o meu pedido que ele lá veio trazer. A rapariga mantinha-se estática, parecendo que morreu de pé, ali, naquele canto do balcão. Dava para perceber que eles tinham estado a discutir, ou que simplesmente detestavam-se mutuamente. Durante a meia hora que lá estive, mantiveram os seus postos e ninguém entrou. Era eu e eles. Foi algo tão estranho que nem sei explicar o motivo de ontem, quando voltei à Pinheiro Chagas, ter entrado lá novamente. A Pastelaria Toninho, assim se chama, continuava cheia de bolos e bolinhos, bolachas e biscoitos, e vazia com as duas almas, cada uma no seu lado do balcão. Voltei a sentar-me mas antes pedi o café e uma bolacha. Ela continuou sem se mexer e foi o mosca morta que em trouxe o meu pedido à mesa. Continuei espantada com a quantidade exorbitante de doces que a casa tem e, mais uma vez, ninguém entrou e ninguém saiu enquanto lá estive. Não sei quem come todos aqueles doces, nem sei se alguma daquelas alminhas é o dono ou até se são ambos. Mas ele parece que é torturado todos os dias e ela morreu há muito. A única coisa que ali tem alma são os doces que os há para todos os gostos. Tenho vontade de lá entrar novamente. Tentar perceber que sítio é aquele onde não há clientes, mas há oferta de sobra para ninguém, ou apenas para mim. Se puderem passem por lá, sentem-se e tentem perceber o que se passa na Pastelaria Toninho, na Rua Pinheiro Chagas e depois informem-me.

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