Às vezes penso em mim. É um exercício
que todos devíamos fazer, em vez de catalisarmos as vidas dos outros,
refletirmos a/na nossa. E ao pensar em mim, ao refletir o que sou e o que tenho
sido e o que poderia ser, noto que esta cabeça maravilhosa só podia dar-me
pesadelos pela complexidade que encerro. Tanto leio ensaios sobre educação,
como devoro uma boa biografia, como me esparramo num excecional romance, como como
ao pequeno-almoço um policial e, salve-me Santo Agostinho não conseguir ler
Paulo Coelho nem Nicholas Sparks. Li de fio a pavio Marx, devorei Carl Sagan
com a mesma alegria com que leio a Máxima e a vogue. Entre a Pais e Filhos meto
uma Happy. Adoro o Jornal I e o Publico, mas deito sempre um olho ao Correio da
Manhã. Adoro arranjar-me e sentir-me bonita, da mesma forma que amo os sábados em
que me visto e nada condiz com nada, em que pareço um maltrapilho. Se o vinho
tinto me eleva o espirito, o branco solta-o. Aprecio um bom charuto, mas
detesto o cheiro do mesmo quando não sou que estou a fumá-lo. Adoro viajar,
fazer malas e sair para o mundo e preciso, como de pão para a boca, ficar em
casa, dias e dias, semanas e semanas, sem sair para lado nenhum. Aprecio um bom
jantar, num sítio requintado, que me tratem como uma princesa, da mesma forma
que às vezes só me apetece comer um bom bitoque naquelas tascas onde existem
baratas a nadar de costas no molho.
Sou capaz de passar dias e dias
a ouvir ópera de tal forma alto que parece que está alguém aos gritos na minha
sala, da mesma forma que me divirto à brava ao ouvir o José Cid e sei as letras
de cor e salteado. Choro ao ouvir Antony, Rodrigo Leão, mas consigo apreciar
uma Rita Guerra, e há músicas de Paulo Gonzo que me fazem cantar alto e com
alegria ‘Sei de cor’. Gosto que me liguem, que me mimem, que digam que sou única,
mas também gosto que me esqueçam, que me deixem no canto a lamber feridas. Gosto
de ser romântica, fazer surpresas, mas também esqueço o outro, desligo e firo
sentimentos. Adoro a minha aldeia, mas já não viveria lá. Gosto de me sentir
citadina, mas sem viver numa cidade demasiada intrincada. Gosto do anonimato,
mas aprecio um ‘olá’ num sitio onde não era suposto conhecer ninguém. Tenho
dias que aposto toda a minha paupérrima fortuna em como o mundo é gigante e
outros que afirmo convictamente a sua pequenez.
Nada é constante em mim, nada e
pensar-me também me provoca uma certa dor de cabeça. Vou tomar uma aspirina efervescente
que me sabe a sumol laranja.
Gosto de ti.
ResponderEliminar<3
EliminarUm dia vou ter coragem de abrir assim o "meu livro", alto e em bom som :) Até lá, fico a ler as suas palavras*
ResponderEliminaràs vezes sabe bem abrir a caixa de pandora
EliminarAdorei. O teu melhor texto.
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