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quinta-feira, 13 de abril de 2017

O meu pai

O meu pai nunca foi de falar muito. E eu sempre lhe tentei chegar. Sempre. Quando era miúda, deitávamo-nos no terraço nas quentes noites de verão a olhar o céu. Só falávamos quando um de nós via uma estrela cadente. Só queria ver as estrelas para o ouvir. Havia noites em que nem uma aparecia. Ontem ele estava a comer uma maçã no beiral das escadas que dão para a cozinha. Sentei-me ao seu lado. Sem saber o que dizer, disse:

- esta macieira está cheia de flores. Vai dar muitas maçãs. 

E ele pergunta:

- esta quê?

Foi a ânsia de Meter conversa que me fez escorregar na ignorância. Olhei melhor para a árvore. Olhei para as folhas. Remendei:

- enganei-me, queria dizer esta laranjeira.

Já não respondeu. Semi sorriu. Afinal a urbe e a cidade ainda não engoliu a filha. Ainda consigo descortinar as árvores de fruto. Menos mal. Sim, ainda sou uma miúda da aldeia que se atreve a viver na cidade.

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