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terça-feira, 18 de março de 2014

a violência da aculturização


Há empresas americanas que têm os seus call center em Nova Deli, India. Quem trabalha nesses call centers trabalha à noite que é quando é dia nos EUA -  durante o dia são sítios abandonados, sem gente. Os trabalhadores são obrigados a ver novelas americanas de forma a estarem enturmados com os tiques de vocabulário, familiarizados com a vivência americana. Têm de saber falar inglês americanizado e sofrem, desta forma, de uma vida dupla: durante o dia são indianos e à noite têm de ser o mais americanos possível. Mesmo para os que têm dificuldades financeiras, poucos são os que estão neste emprego mais do que 2 ou 3 anos. É de uma violência para a mente, para esta parasitação cultural, que a maior parte não aguenta. É simples imaginarmos o que seria de nós se à noite deixássemos de ser portugueses e passássemos a ser japoneses. Tínhamos de falar japonês amiúde, com trejeitos típicos, ouvir as telenovelas japonesas, estarmos a par da cultura e fazer um esforço sobre-humano de, quem ligasse, não perceber que falava com um português em vez de um japonês. Esta dualidade de pessoas numa só, mata, espartilha. Dilacera a natureza inicial do individuo. A dada altura já não saberíamos quem, na realidade, eramos. A dada altura olhávamos e já não nos víamos. Se refletirmos, muitos de nós vive assim, embora de forma mais levezinha: veste uma pele, no trabalho, que não é a dele. Finge. Mistura-se o que é com o que pretende ser. E muitas vezes isso resulta num nó que não se desata a não ser com uma infelicidade que tantos trazem amarrados a si.

2 comentários:

  1. Acredito. Conheço pessoas a trabalharem nesse cruel mundo. Sabia que algumas empresas de cá, já têm call center's em países africanos de língua portuguesa. É um trabalho duro cruel e pouco remunerado. Com contratos mensais. Falo de cá...imagino por lá...

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  2. Não é preciso ir à Índia.

    Portugal já é uma plataforma de call centres de suporte para o resto do mundo. Os salários são baixos e os portugueses têm jeito para línguas. Quando nos referíamos ao nosso futuro no mercado dos serviços no âmbito do mercado global, temos aí a resposta: pequeno banho de realidade.

    E Portugal também já é cliente há anos desse tipo de serviços. Quando ligas para o serviço informativo da Portugal Telecom, muito provavelmente a pessoa que te atende estará em Cabo Verde. Não sei se vêem lá as novelas da TVI para se "ambientarem"...

    O futuro chega mais depressa do que esperamos!

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