Natália Correia sempre me
fascinou. Aliás, não deve haver por aí nenhuma mulher que apreciando mulheres
de espirito livre, não tenha um pequeno e sociólogo fraco por uma mulher como
ela. Por isso quis muito ler o livro O Botequim da Liberdade de António
Dacosta. Este não é uma biografia da Natália, são fragmentos da sua vida, sobretudo
à volta das personalidades que ela conseguiu reunir no seu botequim da Graça. Fascina
perceber que as tricas da política não mudaram assim tanto, apenas temos novos
e diferentes usuários. Importa focar a mulher, a açoriana de temperamento
inconstante, de feitio ora doce ora irascível, que deu dimensão ao lugar; a
parte da política nos idos anos 80 e início dos anos 90 e à sociedade
portuguesa – esta comunidade de malta ainda profundamente conservadora. Não
consigo imaginar que dores terá tido esta mulher que apostava na androgenia dos
seres; esta mulher absolutamente díspar daquilo que era aceitável a uma lady de
então; esta mulher que pensava, como agora gostamos tanto de dizer: fora da
caixa.
Parti para o livro gostando
muito dela e, pelo meio, tive algumas desavenças com o seu feitio e as suas
ideias. Receei chegar à ultima folha a detestá-la, por ser, de alguma forma, um
misto de gente que afirma a liberdade mas que também a coíbe bastando, para
isso, não gostar de uma determinada pessoa ou, mais, das suas ideias. Uma
mulher que de alguma forma era viperina, insatisfeita, temperamental… temi
mesmo deixar de sentir esta coisa que, afinal, ainda sinto. E sinto porque a
sua dimensão intelectual foi maior que o seu feitiozinho de gaja. Sinto porque
reconheço a sua importância na luta por alguns direitos importantes num Portugal
pós-Estado Novo ainda muito obtuso, fechado, receoso e cinzento. Sinto, mas
vejo nela alguma normalidade, que não via. De certa forma, este livro restituiu
a Natália ao mundo dos mortais, retirando-a do alto do pedestal, o que não é
forçosamente mau.
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