Quando ela me ligou, pensei que
me ia pedir lixivia ou sonasol. Na verdade, com uma voz tímida a minha
empregada com quem apenas falei meia dúzia de vezes e todas elas invocando
produtos de limpeza ou duvidas acerca da minha casa, disse: ‘D. Carla, desculpe
estar a ligar-lhe mas por acaso tem o livro da Harper Lee, eu só sei o nome em
inglês e é To Kill a Mockinbird?’ Olhei para o telemóvel a confirmar se era
mesmo a C. Perguntei: ‘Desculpe, quer o quê?’ E ela, num tom ainda mais sumido
e talvez arrependida disse: ‘Creio que o livro que eu gostava de ler se chame
Como matar uma cotovia, não sei bem, só sei em inglês e como tem tantos livros
pensei que talvez tivesse este e me pudesse emprestar’. Fui atingida em cheio,
como um soco no estômago, pelo meu mesquinho preconceito. A senhora que vai uma
manhã a minha casa, pequenina e viúva, com um semblante triste e sorumbático e
que aniquilou os fungos da minha casa- de-banho, pediu-me que lhe emprestasse o
To kill a Mockinbird (vamos abrir um parenteses para dizer que eu nem sabia
como se dizia cotovia em inglês. Ela sim). Não tenho pensado noutra coisa. Eu
devia ser a pessoa menos preconceituosa do universo por, pelo facto de ter
vindo de uma aldeia e também por não ter médicos nem advogados na família, ter
sido alvo de algum preconceito urbano-depressivo. E fui preconceituosa. Muito.
Vou à FNAC comprar o livro da
Harper Lee para deixar em cima da mesa, a mesma mesa onde deixo as notas com os
meus pedidos para a limpeza da casa.
Como a vida e as pessoas nos conseguem surpreender...
ResponderEliminarMaravilhoso, este post... Por tudo o que significa!
ResponderEliminarUm beijinho!
Paula, beijinhos
EliminarCompreendo-te muito bem, por mais arejada que seja a nossa cabeça, todos temos algumas ideias pré-concebidas... Toca a todos.
ResponderEliminarAdoro que vás comprar o livro :)
:) beijinhos
EliminarTemos que aprender a não subestimar as pessoas e principalmente, creio eu, a interessar-nos por aqueles que fazem parte da nossa vida (ainda que apenas nos façam a limpeza da casa). :) Acho que fazes muito bem em tirar disso uma lição e em oferecer-lhe o livro.
ResponderEliminarAcredita que retirei. Na verdade o interessante da vida é isto mesmo: a constante lição. Beijinhos
EliminarConcordo :)
EliminarMuito bom. Ora toma :)
ResponderEliminaro par de estalos já está dado... LOL a vida encarrega-se de uns quantos de vez em quando! E depois quando me perguntam o que mais me fascina admiram-se que responda que são as pessoas, sempre as PESSOAS!
ResponderEliminarRealmente, a vida, volta e meia, dá-nos assim umas lições! Beijinhos
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