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quinta-feira, 10 de julho de 2014

quando venho trabalhar devia de deixar em casa a mania de querer ser escritora

Há uns anos entrevistei o Adolfo Luxuria Canibal, um tipo inteligente e, para quem não sabe, advogado como profissão principal e musico nas horas vagas (vocalista dos Mão Morta).

Ele escreve maravilhosamente bem e a dada altura perguntei-lhe se não lhe dava para divagar quando tinha de escrever um qualquer processo no âmbito da advocacia. Ele riu-se e disse que, inicialmente, tinha essa mania mas depois ninguém lia, ninguém queria saber das suas palavras mais belas, queriam que ele fosse pragmático e direto ao assunto. Hoje lembrei-me dele quando estava a escrever uma informação. Há modelos de informação a seguir, que isto não é uma ramboia, mas eu tenho dificuldade em segui-los. Desatei a fazer um texto, focada no que tinha para dizer, mas sem seguir nenhum modelo. Fui ao sabor da pena. Palavra mimosa para aqui; palavra mimosa para acolá. Ouço música enquanto escrevo. Reflito no município como se refletisse sobre a beleza da floresta amazónia, ou o conto de fadas que é a cidade de Praga. Espraio-me no papel como se descrevesse pormenorizadamente a forma lenta e apaixonada com que a minha mãe faz uma calda de carne para o arroz de forno. No fim, espero que a minha chefe me diga: ‘Menina Carla, e que tal seguir os modelos instituídos? Se eu quisesse ler um livro, escolhia Coetzee…’

E eu volto a pegar no que escrevi e pragmatizo.

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