Páginas

sábado, 30 de agosto de 2014

Diz-me o que comes e dir-te-ei quem és


‘sabes o que mais gosto em ti?’  a pergunta foi-me feita numa outra vida, mas lembro-me como se fosse hoje. Ele vestia uma camisola vermelha de gola alta e o frio parecia rachar a pele. Com um ar dengoso perguntei ‘o quê?’, à espera de ouvir dizer que era a minha boca, o sorriso, as mãos, as mamas, o sentido de humor, sei lá, tudo menos ‘o que eu mais gosto em ti é a tua lasanha’. A partir desse dia nunca mais fiz uma lasanha em condições. Faço, mas não me dedico a ela. Não é por ciúmes, mas por desamor.

A comida está intrinsecamente ligada à minha pessoa. Vagueio num supermercado com a mesma satisfação com que o faço em plena Avenida da Liberdade. Pelo caminho já odiei uns pratos e amei outros. No entanto, o amor pela comida, pela cozinha, pelos livros de culinária tem vinda o crescer. Por isso, quando me sugeriram que não escrevesse sobre comida neste blog, fiquei um tanto ou quanto triste, amuei um pouco, refleti e cheguei à conclusão que não vou deixar de o fazer. Não vou porque não posso. Era como deixar de falar de mim. Foi à volta da cozinha que cresci com minha mãe perto, com as minhas tias em ensinamentos temperados, a rirem de tudo, a ensinarem-me como se lava umas tripas, se mata um coelho e se depena uma galinha. Sobrevivia na selva, portanto. Ainda hoje é o meu sítio preferido da casa. Na cozinha curo de dramas e guerras interiores e alimento a alma com prazeres indizíveis. Não posso deixar de falar de comida, não posso. Apenas prometo nunca trazer aqui um prato de lasanha. Nunca. Estamos esclarecidos?

 
imagem retirada do blog Starlights husband

 

1 comentário:

  1. Para compensar, toda a gente fala da minha lasanha e diz que é inesquecível! :)

    ResponderEliminar